30 de jul. de 2013

Receita esclarece sobre redução de IPI


A Receita Federal definiu, por meio de solução de divergência, que a redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para o setor de informática e automação pode ser aplicada quando o produto é transferido da indústria para o atacadista para só depois ser vendido ao consumidor final. O benefício foi instituído pela Lei nº 8.248, de 1991. 

Havia, até então, casos em que a Receita negava a aplicação da lei por considerar que a venda deveria ser feita diretamente da fábrica. A uniformização do entendimento sobre o assunto consta da Solução de Divergência da Coordenação-Geral de Tributação (Cosit) nº 12, publicada na edição de ontem do Diário Oficial da União. As soluções de divergência orientam contribuintes e fiscais sobre a aplicação das leis e normas tributárias. 

"Nossa orientação era a de que seria mais seguro vender diretamente do estabelecimento industrial, se possível, para garantir o benefício. Agora, a Receita equiparou a venda direta da fábrica com a feita pelo atacado", diz o advogado Marcelo Jabour, diretor da Lex Legis Consultoria Tributária. Com isso, a suspensão do IPI na transferência de bens da fábrica para o atacadista - instituída pelo regulamento do IPI - fica mantida. 

O artigo 11 da Lei nº 8.248 estabelece as condições para o aproveitamento da redução do IPI. Segundo o dispositivo, as empresas deverão investir, anualmente, em atividades de pesquisa e desenvolvimento em tecnologia da informação a serem realizadas no país, no mínimo, 5% do seu faturamento bruto no mercado interno. Esse faturamento deve ser decorrente da comercialização de bens e serviços de informática, incentivados na forma da lei, deduzidos os tributos correspondentes a tais comercializações, bem como o valor das aquisições de produtos incentivados. 

Fonte:
Laura Ignacio - De São Paulo
VALOR ECONÔMICO - LEGISLAÇÃO & TRIBUTOS

18 de jul. de 2013

Confissão de dívida não impede restituição


A 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que o contribuinte tem o direito de pedir a restituição de tributo que decaiu antes da adesão a parcelamento. Para os ministros, a devolução do que foi pago de forma parcelada deve ser feita mesmo que a empresa tenha assinado uma confissão de dívida. 

Como o caso foi julgado por meio de recurso repetitivo, deve servir de orientação para os demais tribunais. O entendimento também deve ser aplicado pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) - última instância da esfera administrativa -, que segue o que for julgado como repetitivo no STJ. 

O caso envolve uma empresa de móveis que aderiu ao programa de Parcelamento Especial (Paes) em julho de 2003, quando firmou o documento de confissão de dívida. Na época, porém, segundo a defesa do contribuinte, os créditos tributários com fatos geradores ocorridos em 1997 e nos anos anteriores teriam decaído. Isso porque já teriam passado os cinco anos para a Receita Federal efetuar a cobrança, conforme o inciso I, do artigo 173, do Código Tributário Nacional (CTN). Como a companhia tinha assinado o termo de confissão de dívida, a Fazenda argumentou que não haveria direito à restituição. 

Ao perceber que o caso envolvia uma questão emblemática, por haver diversas empresas em situação semelhante, o ministro relator Mauro Campbell Marques encaminhou o recurso para a 1ª Seção como repetitivo. 

Segundo o ministro, como a decadência revoga o crédito tributário, segundo o artigo 156 do CTN, "uma vez extinto o direito, não pode ser reavivado por qualquer sistemática de lançamento ou auto-lançamento, seja ela via documento de confissão de dívida, declaração de débitos, parcelamento ou de outra espécie qualquer". Ele foi seguido pelos demais ministros e a empresa conseguiu garantir o seu direito à restituição. 

Para o advogado tributarista Maurício Faro, do Barbosa, Müssnich & Aragão, a decisão é importante por demonstrar o entendimento dos ministros do STJ de que essa confissão de dívida não é absoluta. O julgado, segundo o advogado, deixa claro que nada tem validade se o crédito tiver decaído. 

Esse mesmo raciocínio poderá ser aplicado para casos de leis sobre tributos que são consideradas inconstitucionais, de acordo com Faro. Esses impostos, se incluídos em parcelamentos que exigem a confissão de dívida, também poderão ser restituídos. "A confissão de dívida não vale para todos os casos e não pode se sobrepor a todos os atos", diz.

O advogado Vitor Krikor Gueogjian, do escritório Ratc e Gueogjian Advogados, ressalta que é comum empresas incluírem em parcelamentos dívidas tributárias que já decaíram. Isso porque as áreas fiscal e jurídica normalmente são separadas. Pode haver a inclusão pela área fiscal sem que o jurídico avalie a discussão judicial dessas dívidas e o prazo decadencial. 

Para Gueogjian, a decisão pacifica o entendimento sobre a questão. Havia, segundo ele, julgamentos isolados no sentido de que a decadência já estava consumada no momento do parcelamento. "Agora, como foi analisado em caráter de recurso repetitivo, isso deve ser aplicado em outros casos, com mais segurança." 

O coordenador-geral da Representação Judicial da Fazenda Nacional, João Batista de Figueiredo, informou por nota enviada ao Valor que a PGFN, inclusive, tem orientação de não mais contestar ou recorrer nessas situações, "por entender que a confissão do contribuinte não reabre o prazo decadencial já decorrido para o lançamento". Para Figueiredo, "de fato, a decadência é uma forma legal de extinção do crédito tributário e, por essa razão, é que eventual parcelamento posterior não torna existente crédito já extinto. Neste caso, deve ser desconsiderada a confissão de dívida que não mais existia". 

Adriana Aguiar - De São Paulo
VALOR ECONÔMICO - LEGISLAÇÃO & TRIBUTOS









STJ reforma decisão que aplicou a desconsideração da personalidade jurídica rejeitada anteriormente


Por maioria de votos, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento a recurso especial contra acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que admitiu nova apreciação de pedido de desconsideração de personalidade jurídica de processo já transitado em julgado. Primeiramente negada, a desconsideração foi aplicada pela decisão contestada. 

Além de verificar que a justiça paulista já havia rejeitado o pedido em decisão transitada em julgado, o relator do recurso, ministro Raul Araújo, destacou que só se aplica a desconsideração da personalidade jurídica quando houver a prática de ato irregular e limitadamente aos administradores ou sócios que o praticaram. 

A situação envolveu um antigo sócio de uma sociedade limitada, que se desligou da empresa em 1982. O negócio que deu origem ao litígio foi firmado um ano antes, em 1981, mas a ação judicial só foi ajuizada em 1993. Além disso, o ex-sócio não figurou como parte no processo. 

Responsabilização afastada 

A ação foi julgada em 2003. O TJSP não admitiu a desconsideração da personalidade jurídica da empresa para comprometimento de patrimônio dos sócios, por entender que não houve comprovação de fraude no negócio jurídico. Também afastou a responsabilização do ex-sócio pela impossibilidade da ação alcançar terceiro que não é parte da relação processual. Essa decisão transitou em julgado. 

O TJSP sustentou ainda que sequer houve citação das rés solidariamente sucumbentes, o que afrontaria o revogado artigo 611 do Código de Processo Civil (CPC) que determinava que, uma vez julgada a liquidação, a parte promoverá a execução, citando pessoalmente o devedor. 

Novo julgamento 

Mesmo diante da coisa julgada material, a parte contrária voltou a ajuizar ação em 2008 insistindo no pedido de reconhecimento da desconsideração da personalidade jurídica. Desta vez, o juízo de primeiro grau deferiu o pedido e a mesma 5ª Câmara de Direito Privado do TJSP, que havia negado a desconsideração da personalidade jurídica em 2003, confirmou a sentença. 

Para o TJSP, não haveria coisa julgada, pois o primeiro acórdão foi fundamentado na inexistência de citação das empresas executadas à época, e que, após regular citação, houve nova apreciação do pedido de desconsideração, o qual restou deferido. 

Acórdão reformado 

Ao apreciar o recurso especial do ex-sócio, o ministro Raul Araújo, relator, entendeu que a decisão do TJSP violou a coisa julgada, uma vez que a corte local já havia decidido sobre a inexistência dos pressupostos materiais e processuais necessários à aplicação da desconsideração da personalidade jurídica. 

Além disso, disse o ministro, “não bastasse o fato de a matéria da desconsideração da personalidade jurídica estar revestida pelo manto preclusivo da coisa julgada, vê-se também que o acórdão recorrido, assim como a decisão agravada, não apontam nenhum fundamento para se aplicar a desconsideração da personalidade jurídica antes rejeitada”.

Araújo ressaltou que a simples inexistência de patrimônio suficiente para satisfazer o pagamento de dívida não é motivo justo e legal para considerar abusiva a conduta do devedor e aplicar a desconstituição da personalidade jurídica.
Seguindo o voto do relator, a Turma reconheceu ofensa à coisa julgada e o acórdão do TJSP foi reformado para reconhecer a inviabilidade de aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica em desfavor do ex-sócio. 

Resp 1193789


16 de jul. de 2013

Estudo mostra falta de transparência em julgamento administrativo fiscal


Uma pesquisa inédita do Núcleo de Estudos Fiscais (NEF) da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV) aponta um cenário preocupante para o contribuinte brasileiro: a falta de divulgação de autos de infração e de transparência em julgamentos de recursos. Criado pelo NEF, o Índice de Transparência do Contencioso Administrativo (iCAT) da União, Estados, Distrito Federal e capital paulista ficou abaixo dos 60 pontos (em uma escala de 0 a 100). A maioria teve menos de 40 pontos. "É uma verdadeira caixa preta. A situação é histórica, mas não tem sido questionada", afirma o coordenador do NEF, Isaías Coelho, ex-secretário adjunto da Receita Federal. 

O desempenho foi medido a partir de dez critérios, dentre os quais a divulgação dos autos de infração questionados pelos contribuintes, das decisões dos órgãos administrativos responsáveis pelo julgamento dos recursos e até de informações básicas, como o número de um processo em andamento, a pauta e o tempo médio dos julgamentos. Segundo a pesquisa, apenas os Estados de São Paulo e Santa Catarina publicam as decisões administrativas de primeira instância. 

Responsável pelo recolhimento de 70% dos tributos, a União ficou em quarto lugar no ranking, com 34 pontos, especialmente porque não divulga os autos de infração lavrados pelos auditores e as decisões das delegacias da Receita Federal. As sessões de julgamento, inclusive, não são públicas e os advogados não podem fazer a defesa oral. 

De acordo com a Receita, os documentos não são divulgados porque contêm informações financeiras e operacionais dos contribuintes, protegidas pelo sigilo fiscal. O artigo 198 do Código Tributário Nacional (CTN) proíbe os servidores da Fazenda Pública de tornarem públicos esses dados. 


Para os pesquisadores do NEF, porém, o sigilo fiscal tem sido usado como "escudo" pela Receita para não abrir informações de interesse público. Com base na Lei de Acesso à Informação, defendem que os governos busquem formas de divulgar, por exemplo, os autos de infração, excluindo dados sigilosos. 

As empresas têm interesse em abrir as informações fiscais, segundo advogados. "Eles podem apagar o valor da cobrança. O que importa é que todos saibam o fundamento legal da exigência do tributo", diz o tributarista Luiz Roberto Peroba, do Pinheiro Neto Advogados. Melhor colocado na pesquisa, o Estado de São Paulo já pensa em formas de divulgar os autos de infração. "Não há nada fechado, mas vamos arrumar um meio alternativo de divulgação", afirma Fábio Henrique Galinari Bertolucci, diretor-adjunto do Tribunal de Impostos e Taxas (TIT), da Fazenda do Estado de São Paulo. 

Os pesquisadores e advogados de contribuintes concordam que mais do que a alta carga tributária e o complexo sistema de arrecadação de impostos é a falta de transparência da fiscalização que atrapalha o ambiente de negócios e a atração de investimentos. "Não conhecer o que pensa a Receita sobre a legislação tributária é um dos maiores problemas do país", diz Peroba. 

O acesso aos dados, segundo os pesquisadores, seria a única forma de diminuir a litigiosidade, legitimar as cobranças, além de controlar os atos dos fiscais. "Só assim posso saber se o Fisco passou a tributar determinada operação sem que houvesse alteração da lei e me defender contra isso", afirma o professor Eurico de Santi, que também coordena o NEF, citando o caso da exigência pelo Estado de São Paulo de ICMS sobre publicidade na internet, que gerou autuações milionárias. "Em 2010, o Fisco paulista passou a exigir o imposto sobre os últimos cinco anos. Mas não havia cobrança nos anos anteriores e a legislação não mudou", diz. Sobre a mesma operação, os fiscais também estariam aplicando multa de 50% sobre o valor do imposto para um determinado contribuinte e de 150% para seu concorrente. 

No Estado de Santa Catarina, segundo melhor colocado no ranking, as decisões administrativas são divulgadas sem o nome da empresa e os valores discutidos. Segundo João Carlos Von Hohendorff, presidente do Tribunal Administrativo Tributário (TAT), a transparência não teve efeito na redução dos litígios, mas na uniformização da atuação da administração. "Quando firmamos uma posição a favor do contribuinte, a fiscalização muda o encaminhamento", diz. 

A presidente do Conselho de Contribuintes de Minas Gerais, Maria de Lourdes Medeiros, discorda da posição do Estado no ranking, em sétimo lugar. Segundo ela, todas as decisões são publicadas e o estoque de processos e o tempo médio de julgamento passaram a ser divulgados nos últimos meses. "Nos preocupamos com a transparência porque isso se reflete em investimentos no Estado", afirma. 

Bárbara Pombo - De Brasília
VALOR ECONÔMICO - LEGISLAÇÃO & TRIBUTOS

10 de jul. de 2013

STJ - PIS e Cofins das concessionárias de veículos devem ser calculados sobre faturamento bruto


A base de cálculo das contribuições ao PIS e Cofins por concessionária de veículos é o produto da venda ao consumidor e não apenas a margem de revenda da empresa (descontado o preço de aquisição). A decisão é da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em julgamento de recurso especial representativo de controvérsia de autoria da GVV Ltda. 

A tese, firmada sob o rito dos recursos repetitivos (artigo 543-C do Código de Processo Civil), deve orientar a solução dos processos idênticos que tiveram a tramitação suspensa até esse julgamento. Só caberá recurso ao STJ quando a decisão de segunda instância for contrária ao entendimento firmado pela Corte Superior. 

Em decisão unânime, os ministros do colegiado entenderam que, caracterizada a venda de veículos automotores novos, a operação se enquadra no conceito de faturamento definido pelo Supremo Tribunal Federal (STF), quando examinou o artigo 3º da Lei 9.718/98, fixando que a base de cálculo do PIS e da Cofins é a receita bruta/faturamento que decorre exclusivamente da venda de mercadorias e serviços. 

Simples repasses 

A concessionária recorreu de decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), que entendeu que a base de cálculo deve ser o produto da venda ao consumidor (faturamento ou receita bruta) e não apenas a margem da empresa. 

Para o tribunal paulista, há contrato de compra e venda entre o produtor e o distribuidor, e não mera intermediação, e o faturamento gerado pela venda ao consumidor produz efeitos diretamente na esfera jurídica da concessionária, o que descaracteriza a alegada operação de consignação. 

No recurso especial, a empresa sustentou que os valores repassados às montadoras, apesar de serem recolhidos pelas concessionárias na venda dos veículos ao consumidor, não representam seu faturamento, mas configuram meras entradas de caixa que serão repassadas a terceiros, sem nenhum incremento em seu patrimônio. 

“Tratando-se de meros ingressos financeiros que não representam receita/faturamento próprios da recorrente, não estão albergados pelo aspecto material traçado para as contribuições ao PIS e Cofins”, alegou a concessionária em seu recurso. 

Concessão comercial 

O relator, ministro Mauro Campbell Marques, destacou em seu voto que a caracterização da relação entre concedente e concessionárias, como de compra e venda mercantil, é dada pela Lei 6.729/79. 

Segundo essa lei, na relação entre a concessionária e o consumidor, o preço de venda é livremente fixado pela concessionária. Já na relação entre o concedente e as concessionárias, “cabe ao concedente fixar o preço da venda aos concessionários”, de maneira uniforme para toda a rede de distribuição. 

“Desse modo, resta evidente que na relação de ‘concessão comercial’ prevista na referida lei existe um contrato de compra e venda mercantil que é celebrado entre o concedente e a concessionária e um outro contrato de compra e venda que é celebrado entre a concessionária e o consumidor, sendo que é esse segundo contrato o que gera faturamento para a concessionária”, afirmou o ministro. 

Assim, as empresas concessionárias de veículos, em relação aos veículos novos, devem recolher PIS e Cofins sobre a receita bruta/faturamento (compreendendo o valor da venda do veículo ao consumidor) e não sobre a diferença entre o valor de aquisição do veículo na fabricante/concedente e o valor da venda ao consumidor. 

REsp 1339767


1 de jul. de 2013

STJ - O equilíbrio necessário na Lei de Improbidade



A Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/92) é uma das grandes conquistas sociais na luta pela moralidade na administração pública. Desde que foi editada, em 1992, vem sendo utilizada como meio de limitar a ação dos maus gestores. Para o STJ, entretanto, não se pode punir além do que permite o bom direito. As sanções aplicadas devem estar atreladas ao princípio da proporcionalidade. 

Esse princípio tem seu desenvolvimento ligado à evolução dos direitos e garantias individuais. Ele garante a proibição do excesso e exige a adequação da medida aplicada. De acordo com Roberto Rosas, no estudo Sigilo Fiscal e o Devido Processo Legal, o princípio da proporcionalidade pode ser entendido como o próprio estado de direito, que se vai desdobrar em vários aspectos e requisitos. 

A solução adotada para efetivação da medida deve estar de acordo com os fins que justificam sua adoção. “É o meio e fim”, afirma Rosas. 

No que se refere à Lei de Improbidade, de acordo com a jurisprudência do STJ, cabe ao magistrado dosar as sanções de acordo com a natureza, gravidade e consequências do ato ímprobo. É indispensável, sob pena de nulidade, a indicação das razões para a aplicação de cada uma das sanções, levando em consideração os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade (REsp 658.389). 

Premissa 

O objetivo da lei é punir os maus gestores. Mas para configurar a conduta, o STJ considerou que a má-fé é premissa básica do ato ilegal e ímprobo. Em um julgamento em que se avaliava o enquadramento na lei pela doação de medicamentos e produtos farmacêuticos entre prefeitos, sem observância das normas legais, os ministros entenderam que não se deve tachar de ímprobas condutas meramente irregulares, suscetíveis de correção administrativa. 

No caso analisado pelo Tribunal, o município de Avanhandava (SP) enfrentou surto epidêmico pela contaminação da merenda escolar. O município foi ajudado pela prefeitura de Diadema, que doou medicamentos e produtos farmacêuticos, sem autorização legislativa. 

O Ministério Público de São Paulo pediu inicialmente o enquadramento do prefeito de Diadema, do ex-prefeito de Avanhandava e da então secretária de saúde no artigo 10 da Lei de Improbidade, com o argumento de que a conduta causou prejuízo ao erário. O tribunal local tipificou a conduta no artigo 11, com a justificativa de que a conduta feriu os princípios da administração pública (REsp 480.387). 

O STJ reafirmou o entendimento de que a ilegalidade só adquire status de improbidade quando a conduta antijurídica fere os princípios constitucionais da administração pública coadjuvados pela má-fé. No caso, não houve má-fé, e por isso não houve condenação. 

Dosimetria da pena 

Os atos de improbidade estão enumerados nos artigos 9º, 10 e 11 da Lei 8.429. Na lei, estão dispostos em três blocos, que tipificam aqueles que importam enriquecimento ilícito, aqueles que causam prejuízo ao erário e aqueles que atentam contra os princípios da administração pública. 

As sanções estão arroladas nos incisos de I a III do artigo 12. Entre elas, estão previstas a suspensão de direitos políticos, que pode variar de três a dez anos; a perda da função pública, o pagamento de multa, o ressarcimento ao erário e a proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais pelo prazo de três a dez anos, dependendo do enquadramento da conduta. 

O STJ tem o entendimento de que as penas previstas no artigo 12 não são cumulativas, ficando a critério do magistrado a sua dosimetria. Esse entendimento vigora mesmo antes do advento da Lei 12.120/09, que alterou o caput desse artigo da Lei 8.429 para estabelecer que as penas possam ser aplicadas isoladamente. 

Diz o artigo 12, em sua nova redação, que o responsável pelo ato de improbidade, independentemente das sanções penais, civis e administrativas previstas em legislação específica, está sujeito a diversas cominações, que podem ser aplicadas “isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade do fato”. 

À época do julgamento do REsp 534.575, em 2004, e antes da Lei 12.120, a ministra Eliana Calmon apontava que era insatisfatória a organização do sistema sancionatório da Lei 8.429, por ter agrupado, em uma mesma categoria, infrações de gravidade variável, em blocos fechados de sanções que não obedeciam a um critério adequado (REsp 534.575). 

No artigo 21, a alteração da Lei 12.120 fez constar que a aplicação das sanções previstas independe da ocorrência de dano ao patrimônio público, salvo quanto à pena de ressarcimento; e da aprovação ou rejeição das contas pelo órgão de controle interno ou pelo Tribunal ou Conselho de Contas. 

Ação especialíssima 

A ação de improbidade é instrumento em que se busca responsabilização. Segundo o ministro Luiz Fux (hoje no Supremo Tribunal Federal), em um dos seus julgados, a ação tem natureza especialíssima, qualificada pela singularidade do seu objeto, que é aplicar penalidade a administradores ímprobos e outras pessoas, físicas ou jurídicas, que com eles se acumpliciam. 

Na prática, trata-se de ação de caráter repressivo, semelhante à ação penal e diferente de outras ações com matriz constitucional, como a ação popular, cujo objetivo é desconstituir um ato lesivo, ou a ação civil pública, para a tutela do patrimônio público, cujo objeto é de natureza preventiva, desconstitutiva ou reparatória (REsp 827.445). 

Relativamente à aplicação das sanções, o STJ tem entendimento de que, não havendo enriquecimento ilícito nem prejuízo ao erário, mas apenas inabilidade do administrador, não são cabíveis as punições previstas na Lei de Improbidade, que, segundo a jurisprudência, alcança o administrador desonesto, não o inábil (REsp 213.994). 

Para o STJ, ato administrativo ilegal só configura improbidade quando revela indícios de má-fé ou dolo do agente. No julgamento de um recurso, a Segunda Turma não reconheceu ilicitude em ação movida contra ex-prefeita de São João do Oriente, pequeno município localizado no leste de Minas Gerais, que se esqueceu de prestar contas das três últimas parcelas de um convênio – firmado com o governo estadual – para a construção de escola (REsp 1.140.544). 

A ex-prefeita foi acusada de causar prejuízo ao município por meio de conduta omissiva. A irregularidade fez com que o município fosse inscrito no Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi) do governo federal, o que causou restrições à assinatura de novos convênios. 

Ao julgar a matéria no STJ, a ministra Eliana Calmon alertou para o texto literal do artigo 11, inciso VI, da Lei 8.429, que dispõe que constitui ato de improbidade deixar de prestar contas quando o agente público estiver obrigado a fazê-lo. No entanto, a simples ausência dessa prestação não impõe a condenação do agente, se não vier acompanhada da “comprovação de elemento subjetivo, a título de dolo genérico” – ou seja, se não forem demonstrados indícios de má-fé. 

Prejuízos ao erário 

O entendimento da Corte é que a aplicação das penalidades previstas no artigo 12 exige que o magistrado considere, no caso concreto, a extensão do dano causado, assim como o proveito patrimonial obtido pelo agente. 

“Assim, é necessária a análise da razoabilidade e proporcionalidade em relação à gravidade do ato de improbidade e à cominação das penalidades, as quais não devem ser aplicadas, indistintamente, de maneira cumulativa”, destacou no julgamento de um recurso o ministro Luiz Fux (REsp 713.537) 

Não retroage 

O STJ firmou jurisprudência no sentido de que a Lei de Improbidade não retroage nem para efeitos de ressarcimento ao erário. A Segunda Turma rejeitou recurso do Ministério Público Federal em ação contra o ex-presidente e atual senador Fernando Collor de Mello. 

O órgão ministerial pedia a condenação do ex-presidente a reparar supostos danos ao erário causados por atos cometidos antes da vigência da lei, mas após a promulgação da Constituição de 1988. 

Por maioria, a Turma, seguindo o voto do ministro Castro Meira, entendeu que a Lei de Improbidade não pode ser aplicada retroativamente para alcançar fatos anteriores à sua vigência. 

O ministro Humberto Martins, que acompanhou essa posição, destacou em seu voto-vista que, para os fatos ocorridos antes da entrada em vigor da lei, é possível o ajuizamento de ação visando ao ressarcimento de prejuízos causados ao erário, mas a ação deve ser baseada no Código Civil de 1916 ou qualquer outra legislação especial que estivesse em vigor à época (REsp 1.129.121). 

A regra é que uma lei disciplina os fatos futuros e não os pretéritos, salvo se expressamente dispuser em sentido contrário, não podendo, de forma alguma e sob nenhum pretexto, retroagir para prejudicar direitos e impor sanções. 

REsp 658389 - REsp 480387 - REsp 534575 - REsp 827445 - REsp 213994 
REsp 1140544 - REsp 713537 - REsp 1129121