13 de ago. de 2013

Aumentam as distorções no mercado livre


Paulo Cezar Tavares: o atual modelo de mercado livre está acabando com a competitividade da indústria

Os efeitos da Lei 12.783, sancionada pelo governo no início do ano com o objetivo de reduzir as tarifas de energia elétrica, têm criado distorções no mercado livre de energia, segundo especialistas que participaram de painel que debateu o tema no 14º Encontro de Energia da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). Anunciada pelo governo federal em fevereiro, a redução das tarifas de energia elétrica teve um impacto limitado nas indústrias e comércio ligados à média e baixa tensão. No mercado cativo (em que residências e pequeno comércio e indústria compram de distribuidoras, sem liberdade de escolha do fornecedor), a redução chegou até 28%, enquanto que, para os consumidores livres (grandes indústrias e shoppings), que compram livremente de comercializadoras e geradoras, o impacto foi muito menor, chegando a 10% em média.

Uma parte da explicação dessa diferença está no fato de que o governo usou a energia dos ativos de concessão de geração que venceriam entre 2013 e 2017 para reduzir a cotação do insumo no mercado cativo. As concessionárias cujos ativos expiravam nesses anos e aceitaram os termos do governo da MP 579 (posteriormente transformada na Lei 12.813) passaram a apenas operar e manter as usinas. Na regulação anterior, vendiam a mais de R$ 90 o MWh e agora terão de aceitar preços ao redor de R$ 20 o MWh. Todos esses lotes com preço mais baixo foram alocados no mercado cativo.

Para Paulo Cezar Tavares, vice-presidente da Associação Brasileira dos Comercializadores de Energia (Abraceel), o atual modelo de mercado livre está acabando com a competitividade da indústria brasileira. Segundo ele, o mercado livre é responsável pela comercialização de energia para cerca de 60% do PIB industrial brasileiro, tem grande potencial de crescimento, mas enfrenta atualmente as deficiências de âmbito regulatório.

Entre os principais fatores de incertezas para a formação de preços, de acordo com Tavares, está a Lei 12.783/13, que baixou os custos de energia pela redução dos encargos setoriais e das concessões de geração, criou um regime de cotas de garantia física de energia para o mercado regulado, mas não deu isonomia ao ambiente de contratação livre (ACL). "Para uma indústria com demanda de 10 MW, a alocação das cotas de energia traria um ganho de R$ 15,7 milhões em 30 anos. Equivale a 20 meses de energia grátis", explica Tavares. "Considerando toda a indústria brasileira do mercado livre, o prejuízo é de R$ 30 bilhões", afirma. "O mercado reage instantaneamente às mudanças regulatórias, por isso elas devem ser feitas com muita calma e depois de muita discussão", adverte Carlos Caminada, gerente de risco e inteligência de mercado da Ecom Energia, que atua na comercialização de energia e gás natural.

Outro grande impacto no setor elétrico foi causado pela Resolução nº 3 do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), divulgada em março pelo governo. A resolução muda a forma como é compartilhado o custo de acionamento das térmicas a gás natural. Anteriormente, esse custo era todo do consumidor. Passou agora a poder ser dividido entre mais elos da cadeia, como autoprodutores, comercializadores, consumidores e geradores. Isso abriu uma guerra de liminares.

"Isso resultou em processos de judicialização do setor, o que nunca aconteceu antes, na redução acentuada da taxa de retorno dos atuais projetos de geração e no aumento da incerteza para os novos projetos de geração com provável aumento nos preços da energia nova", destaca Tavares.

No entender de Carlos Caminada, as características do sistema elétrica brasileiro pesam decididamente na formação dos preços no mercado livre. "O que mais chama a atenção no nosso mercado é a nossa matriz, 70% focada em fontes hídricas e, o restante, nas fontes térmicas", diz, alertando para o problema de o país ser totalmente dependentes da chuva. Condições tropicais implicam alta variabilidade e baixa previsibilidade das vazões, por isso os preços oscilam tanto. "A volatilidade faz parte da realidade e tende a crescer", afirma. As evoluções regulatórias são necessárias, de acordo com Caminada, mas o impacto do novo modelo regulatório são consolidadas no PLD e já afetam os preços dos contratos. "É preciso ter em conta que um mercado com mais transparência tende a ter maior liquidez, favorece a todos os agentes e a melhorar alocação de recursos em toda a cadeia", indica.

Segundo Igor Alexandre Walter, assessor da secretaria executiva do Ministério de Minas e Energia (MME), o esforço do governo na redução estrutural dos custos, com a prorrogação das concessões de serviços públicos de transmissão e geração, considerando amortização dos ativos na nova tarifa calculada, com adesão de 100% das transmissoras e 60% das concessionárias, basicamente, atende anseios da sociedade. "Com isso, chegamos a uma redução significativa do preço da energia", diz. "E isso serve de um novo patamar de referência para preço no ambiente livre", diz.

A redução de encargos e tarifas, observa Walter, beneficia igualmente os dois segmentos de mercado: livre e regulado. É uma nova referência de preços para os contratos de mais longo prazo, no mercado livre, e para o consumidor diminui o custo de oportunidade da energia elétrica. "A tarifa de energia elétrica vinha numa trajetória de se deslocar do IPCA (o índice oficial para aferição das metas inflacionárias). Como efeito da lei, houve correção dessa trajetória e a tarifa voltou a se aproximar do IPCA", explica.


Fonte:
Por Genilson Cezar | Para o Valor, de São Paulo
Jornal Valor Econômico